Frida Kahlo

Frida Kahlo foi uma pintora, escritora e ativista política mexicana nascida em 6 de julho de 1907. Ela é famosa por ter pintado uma grande quantidade de autorretratos exibindo suas convicções políticas, de sua origem cultural indígena, suas limitações físicas e questões emocionais. O terrível acidente da qual foi vítima aos 18 anos marcou sua vida para sempre.

Apesar disso, a artista viveu até os 47 anos e pintou dezenas de quadros. Até a década de 1970, a obra de Frida Kahlo não desfrutava da fama que alcançou nos últimos anos, estando confinada ao próprio México e o círculo das artes. Sua biografia escrita por Hayde Herrera em 1983 foi uma etapa importante no reconhecimento mundial da artista. O filme de 2002 estrelado e dirigido por Salma Hayek deu ainda mais folego à chamada Fridamania, conquistando para Frida Kahlo fãs e admiradores de todo mundo.


Infância e adolescência

Frida Kahlo nasceu em Coyoacán, próxima à Cidade do México em 1907. Terceira filha de Carl Wilhelm Kahlo e Matilda Gonzalez y Calderon, seu nome de batismo era Magdalena Carmen Frida Kahlo y Calderon. Seu pai era de ascendência húngara e judaica, nasceu em Pzorheim, na Alemanha e se mudou para o México em 1891 com apenas 18 anos de idade. Ele trabalhou como fotógrafo durante toda sua vida. A mãe de Frida descendia de indígenas e espanhóis. Pode-se ver a exposição e exaltação por parte de Frida de suas múltiplas raízes culturais e étnicas nos quadros Meus avós, meus pais e Eu de 1936 e Minha Ama e Eu de 1937.

Desde pequena, Frida ajudava o pai no estúdio fotográfico e foi com ele que ela teve os primeiros contatos com a arte. A relação dos dois sempre foi estreita. Guilhermo, nome que o pai de Frida Kahlo adotou uma vez no México, incentivava a filha a explorar seu lado artístico. A relação de Frida Kahlo com a mãe, por outro lado, era distante e por vezes conflituosa. O comportamento rebelde da artista se chocava com as convicções religiosas da mãe. 

Aos sete de anos de idade, Frida contraiu poliomielite. Sua perna esquerda sofreria com a doença e ficaria atrofiada como consequência. Sabe-se que na escola, Frida sofreu bullying pela deficiência mas que independente disso, seu pai a encorajou a ser ativa e praticar esportes, como a natação. Em 1922, Frida Kahlo iniciou seus estudos na Escola Nacional Preparatória. Seu objetivo era ingressar no curso de medicina. Foi ali que Frida conheceu Diego Rivera, vinte anos mais velho, e que havia sido encarregado de pintar um mural no auditório da instituição. 

Frida Kahlo e o acidente e o início da carreira

Em 1925, quando retornava para casa da Escola Preparatória com seu namorado Alejandro Gómez Arias, o bonde em que o casal se encontrava foi atingido por um trem. Frida sofreu inúmeras fraturas, muitas na perna que já trazia as sequelas da pólio, além de ter tido a bacia transpassada por um corrimão. Frida Kahlo passou ao menos um mês internada e o acidente lhe rendeu um incontável numero de cirurgias por toda a sua vida.

Em decorrência dele, a jovem desistiu do sonho de se tornar médica e também se tornou incapaz de levar uma gravidez a termo. Apesar de ter muitas vezes representado sua dor física em quadros – citamos como exemplo A Coluna Quebrada e Arvore da Vida – ela nunca pintou o acidente em si, indicativo talvez do quanto ainda ele ainda lhe chocava.

É amplamente conhecida medida que a mãe de Frida tomou para entreter e consolar a filha durante as longas semanas de repouso absoluto: tintas e telas, além de um espelho, instalado especialmente no alto da cama da jovem para que ela pudesse ao menos pintar a si própria. Frida Kahlo nunca se recuperou totalmente e o acidente deixou sequelas permanentes.

Em 1927, Frida afiliou-se ao partido comunista e deu inicio à sua militância política. No ano seguinte, Tina Modotti lhe apresentou Diego Rivera, que já era um comunista afiliado. Posteriormente Frida levou algumas de suas telas para a Secretaria de Educação Publica, onde Diego trabalhava em um mural. Aparentemente, o pintor ficou impressionado com o trabalhado da jovem e logo em seguida começaram a se relacionar. Os dois se casariam dali cerca de dois anos. 

Casamento com Diego Rivera e mudança para os Estados Unidos

Frida Kahlo se casou com Diego Rivera em 21 de agosto de 1929. Sabe-se que a relação não era bem vista principalmente pela mãe de Frida, devido às grandes diferenças entre os dois.  Em 1931, Diego foi chamado para pintar murais em Detroit de modo que o casal partiu para os Estados Unidos. Pela primeira vez longe da terra natal, Frida pode conhecer outra cultura e outros povos, em um país marcado pelo rápido desenvolvimento tecnológico e industrial. Sua produção artística foi dedicada à compreensão e crítica dessa nova realidade.

Quadros como Autorretrato na Fronteira do México com os Estados Unidos de 1932 e Ali Penduro Meu Vestido de 1933 explicitam a visão de Frida sobre o avanço capitalista, a produção de bens desenfreada, a poluição do ar (e mesmo sonora), a urbanização desmedida e a artificialização da vida. 

Em 1932, ainda vivendo em Detroit, Frida decidiu que tentaria engravidar mais uma vez apesar das tentativas frustradas anteriores. Em consulta com um médico, foi sugerido que se mantivesse em repouso quase absoluto de modo a não sobrecarregar os ossos da bacia, prejudicados pelo acidente de 1925. As recomendações porem se mostraram infrutíferas e Frida acabou sofrendo outro aborto em meados de 1932.

A frustração e dor, sofridas ainda em um país estrangeiro, foram registradas na tela Hospital Henry Ford, um dos primeiros a tratar o luto pela perda de um filho não nascido. 1932 ainda traria outra grande perda para Frida. Naquele ano ela e Diego retornaram ao México, pois a mãe de Frida já se aproximava da morte. 

Foto de Frida Kahlo com seu quadro As Duas Fridas
Frida Kahlo e seu aluno Arturo Estrada em foto de Lola Alvares Bravo de 1933. Fonte: Denver Art Museum. Frida Kahlo em 1939 ao lado de seu quadro As Duas Fridas em foto de Nickolas Murray. Fonte: Hudson River Museum.

É de conhecimento geral que Diego Rivera manteve casos extraconjugais durante todo o seu casamento com Frida. A artista também, como se sabe, manteve relações fora do casamento, tanto com homens (como o fotógrafo Nickolas Murray) quanto com mulheres. Em 1934, porém, ele se relacionou com a própria irmã de Frida. Os dois se separaram e Frida se mudou da Casa Azul para um apartamento na Avenida Insurgentes. A pintora então partiu para Nova Iorque com as amigas Anita Brenner e Mary Schapiro. Viagem que ela repetiria no ano seguinte. Frida voltou a ter contato com Diego Rivera em 1935, quando ambos trabalharam juntos para arrecadar fundos aos mexicanos que se voluntariaram a lutar na guerra Civil Espanhola. 

1937 foi o ano em que Frida Kahlo acolheu Leon Trotsky e sua esposa Natalia na Casa Azul apesar das ameaças de morte ao dissidente do partido comunista. As janelas do quarto em que o casal vivia tiveram que ser gradeadas. O perigo constante fez com que Trotsky tivesse que abandonar a Casa Azul eventualmente. Foi em 1937 que a pintora executou Minha Ama e Eu – quadro que dedicou a Trotsky – O Defunto Dimas e Meus Avós, Meus Pais e Eu.

No ano seguinte, ocorreu a famosa visita de André Breton ao México e seu encontro com Frida, Rivera e Trotsky. Ainda em 1937, Frida estampou a famosa edição de outubro da Vogue tendo sido fotografada por Toni Frissei, com o artigo intitulado “Señoras do Mexico” de Alice-Leone Moats. No ano seguinte as vestimentas elaboradas de Frida Kahlo não passaram despercebidas em Paris e a famosa designer Elsa Schiaparelli lançou um robe chamado Madame Rivera inspirado nos trajes tehuana usados pela pintora1.

No ano seguinte, Frida conseguiu pela primeira vez vender alguns de seus quadros. Cinco foram adquirido pelo ator Edward G. Robinson. Com o apoio de André Breton, Julien Levy, célebre galerista de Nova Iorque, celebrou a primeira exposição individual de Frida Kahlo, com cerca de 25 quadros. Na ocasião, pelo menos metade das obras foram vendidas. Logo em seguida, Frida ela viajou para Paris, no contexto da exposição Mexique, organizada por André Breton em colaboração com Marcel Duchamp.

Duchamp seria um dos poucos artistas surrealistas que agradariam a Frida que no geral não se integrou totalmente ao grupo. A ideia era a de que 18 telas da pintora fossem expostas junto com objetos pré-hispânicos, fotos de Manuel Alvarez Bravo e ex-votos. Apesar de problemas de logística, Mexique também teve êxito e um dos trabalhos de Frida, A Moldura (1938), foi comprado pelo museu do Louvre. 

Ainda nessa época Kahlo pintou uma de suas obras mais icônicas e famosas, As Duas Fridas, que compôs a Exposição Internacional do Surrealismo, no México, organizada por Paalen e César Moro. A exposição foi aberta em janeiro de 1940 na conhecida Galería de Arte Mexicano, de Inés Amor. Em 1940 Frida ainda esteve presente em mais duas exposição: a Contemporary Mexican Painting and Graphic Art (São Francisco) e Viente Siglos de Arte Mexicano no MoMa organizado por organizada por Miguel Covarrubias e Roberto Montenegro. Frida participaria ainda da exposição 31 Women da galeria de Peggy Guggenheim, em 1941.

Em 1943, Frida começou a lecionar na escola Esmeralda. A partir daí sua saúde começou se deteriorou tanto devido às consequências do acidente quanto do abuso de álcool e cigarro. No ano seguinte, ela recebeu um premio de 25 mil pesos do Instituto Nacional de Belas Artes. Sua saúde continuou em declínio a ponto de em 1946 passar mais de 8 meses usando um colete de metal. Sua produtividade foi afetada, porém são desses anos obras célebre como auto retrato Pensando em Diego e Raízes.

Autorretratos, o México e o Amor: O estilo de Frida Kahlo

Um dos principais temas de Frida, recorrente por toda a sua carreira, é o da dor. Seja física ou emocional, ela está presente em obras como Coluna Quebrada e outras. Condenada a uma vida de acompanhamentos médicos, cirurgias reparadoras e crise de dores, não causa surpresa o fato de Frida ter tomado tais experiências como matéria prima de seus quadros. A esterilidade também resultante do acidente seria mais um dos pontos explorados pela pintora que foi uma – senão a primeira – uma das primeiras a retratar em tela não apenas o assunto tabu do aborto como também o do parto/nascimento e da amamentação. 

Diego Rivera que, muitas vezes, esteve no centro do sofrimento da esposa ao longos dos anos de casamento, tanto pelos inúmeros casos extraconjugais quanto por sua obsessão e ataques de ciúmes que tinha da esposa. Seus sentimentos por Diego – e as diversas fases que o relacionamento dos dois atravessou – são temas de quadros como Retrato de CasamentoPensando em Diego e O Abraço.

Grande parte do público e dos fãs da pintora com certeza tem Frida como a artista que, acima de tudo, pintou a próprio sofrimento. Porém é importante lembrar que a arte de Frida não pode facilmente ser resumida a um único aspecto de sua vida ou a um único tema. Questões como o nacionalismo, a cultura indígena, o anticapitalismo americano e o comunismo, a celebração da natureza e culturas mexicanas são temas essenciais em sua obra. Nas palavras de Helland “a dor pessoal de Kahlo não deveria eclipsar seu compromisso com o México e com o povo mexicano2

O Tempo Voa (1929). Fonte: FridaKahlo.org. Auto Retrato com o Cabelo Cortado (1940). Fonte: MoMA. Auto Retrato com Colar de Espinhos e Beija-Flor (1940). Fonte:  HRS.

Após ver o trabalho de Frida, sabe-se que André Breton a considerou uma artista surrealista por excelência. Como fica claro pelo texto que o líder do grupo escreveu para o catálogo da exposição da pintora nos Estados Unidos, Frida havia, de alguma forma, alcançado ou acessado os preceitos surrealistas por si mesma, sem ajuda ou orientação: “Minha surpresa e alegria foi sem medidas quando eu descobri na minha chegada ao México, que o trabalho dela tinha florescido, em suas ultimas telas, em uma surrealidade pura, apesar do fato de ter sido concebida sem qualquer conhecimento prévio das ideias que motivavam as atividades dos meus amigos e de mim mesmo”3.  

A própria artista nunca concordou com essa avalição de sua arte ao dizer com todas as palavras “eu não me considero uma surrealista” e, mais enfaticamente

Eu detesto o surrealismo. Para mim, parece uma manifestação da arte burguesa. Um desvio da verdadeira arte que o povo espera do artista. Eu desejo ser digna, com minhas pinturas, do povo ao qual eu pertenço e das ideias que me fortalecem.”4

Reconhecimento e legado

Em 1950, sua condição física e psicológica era alarmante. Após mais uma operação na coluna, Frida permaneceu internada no Hospital Inglês da Cidade do México por quase um ano. Em 1953, a Galería de Arte Contemporaneo organizou a primeira exposição individual de Frida Kahlo no México, coordenada por Lola Alvares Bravo. Já muito enfraquecida e debilitada, Frida teve que ser levada para a própria exposição em uma cama, de ambulância. Em 1954, Frida pintou sua última tela, uma natureza morta intitulada Viva a Vida. Ela morreu em 13 de julho de 1954.

Por ocasião de sua morte, um de seus amigos, Andrés Henestrosa, escreveu sobre o fim da vida da artista: “Com sua morte, vem o fim do espetáculo de uma mulher que era como uma arvore, pequena e frágil, mas tão profundamente enraizada na terra da vida que a morte lutou por anos para arranca-la”5.

Artigos Relacionados

Minha Ama e Eu de Frida Kahlo

O Tempo Voa de Frida Kahlo

Referências

  1. SUTHERLAND, Camilla. Indigenismo and the Limits of Cultural Appropriation: Frida Kahlo and Marina Núñez del Prado. Angelaki: Journal of the Theoretical Humanities, 27(3-4), 2022. 75-90. Aqui. p. 84. ↩︎
  2. HELLAND, Janice. Aztec Imagery in Frida Kahlo’s Paintings: Indigenity and Political Commitment. Woman’s Art Journal, Autumn, 1990 – Winter, 1991, Vol. 11, No. 2 (Autumn, 1990 – Winter, 1991), pp. 8-13. Disponível no Jstor. p. 8. ↩︎
  3. CHADWICK, Whitney. Women Artists and the Surrealist Movement (London: Thames and Hudson, 2002). p. 86. ↩︎
  4. CALABRO, Fortunata. Frida Kahlo and Mexican Traditional Identity. Visual Past: Journal for the Study of Past Visual Cultures. 2016. pp. 92-107. p. 98. ↩︎
  5. Herrera, Hayden.Frida: A Biography of Frida Kahlo. Bloomsbury, 1998. p. 416. ↩︎
Nascimento: 6 de julho de 1907
Falecimento: 13 de julho de 1954
Origem: Coyoacán, Mexico.
Ocupação: pintora, escritora, professora e ativista política

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