Harmonia é um quadro da pintora espanhola Remédio Varo feito em 1956. Harmonia foi produzido no que se convencionou chamar de a Década Prodigiosa da artista. Foi na década de 1950 que Remedios Varo, então com quase 50 anos, de fato conseguiu se dedicar integralmente à pintura, depois de escapar da Segunda Guerra Mundial, se exilar no México e trabalhar por anos criando cartazes e materiais publicitários. A música é um dos temas que inicialmente chama a atenção do observador, já que a figura sentada tem à sua frente um instrumento feito a partir de uma clave de sol.
Analise de Harmonia
Essa não foi a única vez que a pintura lançou mão de referências musicais em sua produção pictórica: O Flautista e Energia Mágica (do mesmo ano) são apenas alguns outros exemplos de quadros com temas musicais. Harmonia é composto de uma série de outros elementos que faziam parte das crenças e convicções de Remedios Varo. A própria pintora os explica concisamente em carta para a família:
O personagem está tentando encontrar um fio invisível que une todas as coisas, por isso, em um pentagrama de fio de metal, fixa todo tipo de objeto, desde o mais simples até um papelzinho contendo uma fórmula matemática que é já, em si, um acúmulo de coisas; quando ele consegue colocar em seus lugares os diferentes objetos, soprando pela chave que sustenta o pentagrama, deve sair um musica não só harmoniosa mas também objetiva, ou seja, capaz de mover as coisas ao seu redor se assim se deseje usa-la, a figura que se desprende da parede e colabora com ele, representa a sorte ( que tantas vezes intervém em todos os descobrimentos), mas a sorte objetiva.
Quando eu uso a palavra objetiva entendo por ela que é algo fora do nosso mundo, ou melhor dizendo, mais além dele e que se encontra conectado com o mundo das causas e dos fenômenos que é o nosso. 1

Remedios Varo foi também uma artista que com frequência lidou com o tema da arte em si. Músicos, pintores (como em A Criação dos Pássaros), tecedoras e compositores são personagens que aparecem em suas produções e trazem um retrato da arte enquanto processo, cujos frutos são testemunhados pelo observador ainda incompletos ou recém completados. Em artigo com comentários a algumas telas de Remedios Varo, Janet Kaplan, autora da biografia mais completa sobre a artista, comenta Harmonia nos seguintes termos:
“Aqui, a musica é o produto de um compositor andrógino, sentado em um escritório medieval com equipamentos alquímicos. Ajudado por mulheres espectrais que surgem das paredes descascadas, esse musico magico, que também tem as feições de Varo, toma objetos de um baú com sólidos geométricos, joias, plantas, cristais e uma formula escrita a mão – e os coloca na clave de sol, criando a ordem da harmonia musical a partir do caos de possibilidades.”2
Criada na sua Espanha natal, Remedios Varo frequentava museus ainda criança na companhia do pai. Seus pintores preferidos na época eram Hieronimus Bosch e Goya. Em Harmonia, a pintora parece ter se inspirado em obras mais ou menos semelhantes àquelas da mesma época da de seus artistas preferido. Tanto o tema do quarto quanto o uso da perspectiva de seu quadro foram comparados à pintura São Jeronimo em seu estúdio de Antonello da Messina (acervo da National Gallery)
Exemplar do estilo maduro de Remedios Varo, Harmonia foi leiloado em 2019 pela casa Sotheby’s. O quadro foi arrematado por mais do que o dobro das estimativas, alcançando um lance final de mais de 6 milhões de dólares.3
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Referências
- BOLIO, Edith. “A veces escribo como si trazase un boceto” Los escritos de Remedios Varo. Tese de Doutorado. Tecnológico de Monterey. 2008. Aqui. p. 159. ↩︎
- KAPLAN, Janet A. Remedios Varo. Feminist Studies, Vol. 13, No. 1 (Spring, 1987), pp. 38-48. Disponível no Jstor. ↩︎
- Nota da Sotheby’s sobre o quadro. Aqui. ↩︎