Peras Espinhosas é um quadro da pintora Frida Kahlo feito em 1937. Nele, Kahlo explorou um de seus temas preferidos: a natureza-morta. Famosa por seus autorretratos, Frida Kahlo efetuou também dezenas de naturezas-mortas ao longo de sua carreira.
Salomon Grimberg, um dos maiores estudiosos da obra de Frida Kahlo, defende que Peras Espinhosas foi efetuada, “provavelmente lado a lado” de outro quadro: Memorias. Assim, as duas telas, feitas entre 1937 e 1938, devem ser consideradas “peças companheiras” uma vez que compartilham não só uma “paleta idêntica” mas também o mesmo “conteúdo emocional”: “ambas são cenas sangrentas, uma em uma praia e outra em um prato.”1 Tal leitura, Grimberg fez em um artigo de 1991 intitulado “Frida Kahlo’s “Memory”: The Piercing of the Heart by the Arrow of Divine Love“. Uma década depois, o critico retornaria às Peras Espinhosas e sua comparação com Memória.

Peras Espinhosas: a vida íntima e a identidade indígena de Frida Kahlo
Sobre Peras, Grimberg afirma, em seu artigo de 2005, “Frida Kahlo’s Still-Lifes“, que se trata de uma obra sobre a relação de Frida Kahlo e seu marido, Diego Rivera. Mais especificamente, um quadro feito no contexto das frequentes infidelidades e crises que o casal enfrentou. A tela, que o critico chama de uma das naturezas-mortas “mais sangrentas” de Kahlo, faz, para ele, referência a uma canção popular mexicana que diz: “Me he de comer esa tuna aunque me espine la mano.“, ou seja, vou comer essa pera espinhosa mesmo que ela me espete a mão.
Para Grimberg, Kahlo está, aqui, dizendo que “ela ficará com ele [ Rivera] mesmo se ela acabar machucada, o que, com certeza ela ira”.2 Se de fato Peras Espinhosas foi baseada na música, essa primeira voltaria a se repetir 3 anos mais tarde em Autorretrato com o Cabelo Cortado, no qual Frida insere um verso inteiro de uma canção logo acima de seu retrato.
Para Salomon Grimberg, as frutas simbolizam o próprio Diego Rivera. Frida, por sua vez, ao retratar Rivera dessa maneira estaria “infligindo danos semelhantes” aqueles que ela mesma sofreu por parte do companheiro. O critico baseia sua afirmação em uma descrição que Frida fez de Rivera, em seu ensaio intitulado “Retrato de Diego” de 1949, na qual a pintora descreve seu parceiro como um “cacto”, planta que dá origem às peras:
“que floresce com o vermelho mais profundo, o branco mais translucido, e o amarelo solar; coberto por espinhos, ele se esconde dentro de sua ternura.”3
Como já tivemos oportunidade de comentar em quadros como Autorretrato com Colar de Espinhos e As Duas Fridas, interpretações de obras de Frida Kahlo que privilegiam suas questões pessoais, dores e crises matrimoniais, são as que predominam. Tais elementos influenciaram a obra de Frida e foram canalizados em seus quadros. Podemos citar o quadro Xochitl, feito em 1938, e que compartilha com Peras Espinhosas não apenas o tema mas também o destaque do vermelho.
Salomon Grimberg, em seu mesmo artigo em 2005, relaciona Xochitl com o caso que Frida manteve, ao longo de toda a década de 1930, com o fotógrafo húngaro americano Nicolas Murray. Nesse sentido, assim como Xochitl, Peras Espinhosas poderia ser um retrato da paixão de Kahlo e Murray.
De qualquer maneira, a artista nutria uma variedade de inspirações e ambições as quais. Uma delas era sua forte identificação com sua ascendência indígena. Elementos da cultura indígena, principalmente asteca, podem ser encontrados em muitas das pinturas de Frida Kahlo. Desde os objetos do lado mexicano da fronteira, em Autorretrato na Fronteira entre o México e os Estados Unidos, até o símbolo de seu colar em O Tempo Voa.
Segundo Nancy Deffebach, as peras espinhosas eram, para os astecas, metáforas do coração daqueles era oferecidos em sacrifício aos deuses. Em nahuatl, o coração extraído das vitimas de mortes rituais denominava-se “quauhnochtli”, ou seja, “fruta do cacto águia”. Tais referências à cultura indígena não exclui os aspectos autobiográficos da obra de Frida Kahlo, mas se somam a eles e tornam sua obra mais complexa e multifacetada.4
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Bibliografia
DEFFEBACH, Nancy. Picantes Pero Sabrosas: Las Naturalezas Muertas de Frida Kahlo. Congreso Internacional de Teoria e Historia de las Artes. 4º:2007: Buenos Aires. Jornadas CAIA. 12:2007. Buenos Aires. Edición:2007. Aqui.
GRIMBERG, Salomon. Frida Kahlo’s “Memory”: The Piercing of the Heart by the Arrow of Divine Love. Woman’s Art Journal, Autumn, 1990 – Winter, 1991, Vol. 11, No. 2 (Autumn,1990 – Winter, 1991), pp. 3-7.
GRIMBERG, Salomon. Frida Kahlo’s Still Lifes: “I Paint Flowers So They Will Not Die”. Woman’s Art Journal , Autumn, 2004 – Winter, 2005, Vol. 25, No. 2 (Autumn, 2004 – Winter, 2005), pp. 25-30. Disponível no Jstor.
Referências
- GRIMBERG, Salomon. Frida Kahlo’s “Memory”: The Piercing of the Heart by the Arrow of Divine Love. Woman’s Art Journal, Autumn, 1990 – Winter, 1991, Vol. 11, No. 2 (Autumn,1990 – Winter, 1991), pp. 3-7. p. 3. ↩︎
- GRIMBERG, Salomon. Frida Kahlo’s Still Lifes: “I Paint Flowers So They Will Not Die”. Woman’s Art Journal, Autumn, 2004 – Winter, 2005, Vol. 25, No. 2 (Autumn, 2004 – Winter, 2005), pp. 25-30. p. 28. ↩︎
- GRIMBERG, Salomon. Frida Kahlo’s Still Lifes: “I Paint Flowers So They Will Not Die”. Woman’s Art Journal , Autumn, 2004 – Winter, 2005, Vol. 25, No. 2 (Autumn, 2004 – Winter, 2005), pp. 25-30. p. 28. ↩︎
- DEFFEBACH, Nancy. Picantes Pero Sabrosas: Las Naturalezas Muertas de Frida Kahlo. Congreso Internacional de Teoria e Historia de las Artes. 4º:2007: Buenos Aires. Jornadas CAIA. 12:2007. Buenos Aires. Edición: 2007. Aqui. p. 275. ↩︎