Um Conto de Natal é um conto de autoria de Charles Dickens e lançado na época do natal em 1843. Com o título original de A Christmas Carol, a obra se tornou um clássico quase que instantaneamente. Um Conto de Natal, escrito quando Dickens já desfrutava de certa fama, foi um grande sucesso, tendo vendido quase 15.000 cópias na época em que apareceu.
Seu enredo conta a história de Ebenezer Scrooge, um homem de negócios já idoso e amargurado, que recebe a visita de três fantasmas do natal, cada um com uma mensagem. Scrooge, então, embarca em uma saga de autoconhecimento, redenção e, por fim, celebração do Natal.
O sucesso obtido pela obra fez com que Dickens, em anos posteriores, produzisse outros contos natalinos, dentre os quais Um Conto de Natal permanece o mais famoso até hoje. Dezenas de adaptações foram feitas de Um Conto, tanto para o teatro quanto para o cinema e outras mídias.
A Escrita de Um Conto de Natal
Ao longo de Um Conto de Natal, o leitor segue os passos de Ebenezer Scrooge em sua progressiva mas radical mudança. De um homem amargurado e avaro ao extremo, Scrooge (re) descobre não apenas sua própria generosidade mas seu afeto e amor com relação aos outros, como seu sobrinho e mesmo seu empregado. Como a quase totalidade das obras de Dickens, Um Conto de Natal expõe a avareza e ambição desmedidas típicas de sua época.
Em meados do século XIX a Inglaterra de Dickens passava pela Revolução Industrial e já havia se tornado uma grande potência industrial. O império britânico estava em processo de franca expansão. Tanto a industrialização quanto o imperialismo não foram acompanhados por uma diminuição das desigualdades sociais dentro da própria Inglaterra. Apenas 6 anos antes d’Um Conto, Dickens havia lançado sua obra mais famosa, Oliver Twist, cujo centro do enredo é o personagem homônimo e seus colegas, meninos de rua e batedores de carteira.

Toda a exposição, e mesmo denuncia, que Dickens faz da pobreza, desigualdade e ganância, porém, nunca geram qualquer tipo de pensamento revolucionário ou de reforma social. Para o autor, a solução jaz quase que exclusivamente nas pessoas. Os gananciosos, assim, encontram dois destinos. O de Scrooge, a redenção após uma severa admoestação, ou o de seu sócio, Jacob Marley, primeiro fantasma a visitá-lo, que é a punição divina/no pós vida. Em artigo sobre o conto, Cássia Farias analisa o tópico:
“É importante observar aqui que Dickens não pretende abolir a figura do bom homem de negócios burguês, mas sim propor um novo modelo. Ao final da narrativa temos um Scrooge que não abre mão de seus negócios e nem deixa de exercê-los com competência, mas que é mais humano, porque suas ambições materiais foram atenuadas por valores altruístas.”1
O enredo de Um Conto de Natal
Um Conto de Natal foi escrito em 1843 e tem como título original “A Christmas Carol. In Prose. Being a Ghost Story of Christmas“, cuja tradução seria Um Coral de Natal. Em Prosa. Sendo uma História de Fantasma de Natal. O conto foi um sucesso instantâneo. Charles Dickens declarou que durante a escrita do conto ele “chorou, e riu, e chorou de novo, e se animou de uma maneira extraordinária“.2
Cedric Watts em sua introdução a uma edição dos contos natalinos de Dickens, afirma que Um Conto de Natal, em suas características fantasmagóricas, teve influência de uma série de obras clássicas anteriores. Referências a espíritos – e suas mensagens e conselhos aos vivos – remontam à pena de Plínio, o Novo e às Mil e Uma Noites, e à Sir Gawain e o Cavaleiro Verde. Outras inspirações podem ter sido James Ridley e seu Contos do Gênio bem como as obras de Walpole e Edgar A. Poe.3

Watts aponta para outras obras como A Flauta Mágica de Mozart e Songs of Innocence and of Experience de William Blake como referências ao tema da redenção pessoal.4 O pesquisador ainda aponta para a obra de Washington Irving, The Sketch Books of Martin Crayon Gent., não apenas no que toca ao tema do natal como também histórias de espíritos.5
Personagens de Um conto de Natal
Ebenezer Scrooge: Rico, porém infeliz, Ebenezer Scrooge não se importa com os outros e muito menos com o natal. Seu destino muda quando, durante as festividades, recebe a visita de quatro fantasmas.
Jacob Marley: sócio de Scrooge na firma e falecido há sete anos. Visita Scrooge para alertá-lo sobre seu próprio estado atual de penitência e a vinda dos três fantasmas.
Os Cratchit: Bob Cratchit é empregado de Scrooge. Sua família numerosa, mas unida, celebra o natal apesar de difíceis condições financeiras
Fantasma do Natal Passado: o primeiro a aparecer para Scrooge. Ele o leva em uma jornada de volta à juventude, tempo em que Scrooge ainda celebrava o natal.
Fantasma do Natal Presente: o segundo espectro que aparece para o homem de negócios e conduz para a casa de seu sobrinho, onde a festividade é celebrada.
Fantasma do Natal Futuro: o último a aparecer e que mostra a Scrooge um por vir sombrio caso ele continue anti-social e avarento.
Fred: sobrinho de Scrooge que o convida para sua festa de natal mas é rejeitado.

Recepção de um conto de Natal
Um Conto de Natal fez um grande sucesso quando foi lançado: cerca de 14,930 cópias foram vendidas. Tal número significou um ganho de 726 libras para Dickens.6 O conto, porém, trouxe apenas recursos para Dickens mas o reconhecimento de personalidades de sua época bem como do público.
O famoso escritor e ilustrador William Makepeace Thackeray afirmou sobre Um Conto de Natal:
“Quem poderia ouvir qualquer objeção com relação a um livro como esse? Ele me parece um benefício nacional, e para cada homem ou mulher que o leia é uma gentileza pessoal. As duas últimas pessoas que eu ouvi falarem dele eram mulheres; elas não se conheciam, nem o autor, e ambas disseram, a título de crítica, ‘Deus o abençoe!’ Que sentimento esse para um escritor ser capaz de inspirar, e que recompensa a receber!”.7
A escritora escocesa Margaret Oliphant, por outro lado, não foi muito elogiosa quando disse que Dickens, em seu conto, havia descoberto “o imenso poder espiritual do peru de natal”. Em um tom parecido, Edwin Whipple comentou que o autor tinha “cristianizado o comer e o beber, e [conseguido] fazer do estômago, de forma estranha, um órgão da alma.”8
Na Westimenster Review foi publicada uma crítica anônima ao conto, em junho de 1844, que destaca como a questão da pobreza, que perpassa todo enredo, é estrutural. Em seu tratamento da questão, Dickens, como foi visto no item “A Escrita de Um Conto de Natal” defende a caridade como ato individual e não sinaliza a qualquer tipo de reforma social e muito menos revolução. A crítica aborda justamente tal ponto: “os processos pelos quais homens pobres serão capazes de ganhar bons salários, com quais poderão eles mesmos comprar perus, não entram na conta.9
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Bibliografia sobre um conto de Natal
Costa Junior, E. S. da. (2019). Lembrar para lembrar e para esquecer: um diálogo possível entre Dickens, Freud e Ricoeur. Revista De Direitos E Garantias Fundamentais, 20(3), 181–198. https://doi.org/10.18759/rdgf.v20i3.1769
FARIAS, Cássia. CARDOSO, André Cabral de Almeida. “Livreto Fantasmagórico”: Uma Análise de um Conto de Natal e seus Elementos Fantásticos. Scripta Uniandrade, v. 15, n. 2 (2017). Revista da Pós-Graduação em Letras – UNIANDRADE. Curitiba, Paraná, Brasil. Aqui.
JAFFE, Audrey. Spectacular Sympathy: Visuality and Ideology in Dickens’s A Christmas Carol. PMLA , Mar., 1994, Vol. 109, No. 2 (Mar., 1994), pp. 254-265. Disponível no Jstor.
SABLE, Martin H. The Day of Atonement in Charles Dickens’ “A Christmas Carol”. Tradition: A Journal of Orthodox Jewish Thought, FALL 1986, Vol. 22, No. 3, (FALL 1986), pp. 66-76. Disponível no Jstor.
WATTS, Cedric. “Dickens Christmas Stories (Wordsworth Classics).” Christmas Books, Hertfordshire, Wordsworth Editions, 2004, Introduction.
Referências
- FARIAS, Cássia. CARDOSO, André Cabral de Almeida. “Livreto Fantasmagórico”: Uma Análise de um Conto de Natal e seus Elementos Fantásticos. Scripta Uniandrade, v. 15, n. 2 (2017). Revista da Pós-Graduação em Letras – UNIANDRADE. Curitiba, Paraná, Brasil. p. 32. ↩︎
- WATTS, Cedric. “Dickens Christmas Stories (Wordsworth Classics).” Christmas Books, Hertfordshire, Wordsworth Editions, 2004, Introduction. p. xii. ↩︎
- WATTS, Cedric. “Dickens Christmas Stories (Wordsworth Classics).” Christmas Books, Hertfordshire, Wordsworth Editions, 2004, Introduction. p. xvi. ↩︎
- WATTS, Cedric. “Dickens Christmas Stories (Wordsworth Classics).” Christmas Books, Hertfordshire, Wordsworth Editions, 2004, Introduction. p. xvi. ↩︎
- WATTS, Cedric. “Dickens Christmas Stories (Wordsworth Classics).” Christmas Books, Hertfordshire, Wordsworth Editions, 2004, Introduction. p. xvi. ↩︎
- WATTS, Cedric. “Dickens Christmas Stories (Wordsworth Classics).” Christmas Books, Hertfordshire, Wordsworth Editions, 2004, Introduction. p. xxv. ↩︎
- WATTS, Cedric. “Dickens Christmas Stories (Wordsworth Classics).” Christmas Books, Hertfordshire, Wordsworth Editions, 2004, Introduction. p. xix. ↩︎
- WATTS, Cedric. “Dickens Christmas Stories (Wordsworth Classics).” Christmas Books, Hertfordshire, Wordsworth Editions, 2004, Introduction. p. xviii. ↩︎
- WATTS, Cedric. “Dickens Christmas Stories (Wordsworth Classics).” Christmas Books, Hertfordshire, Wordsworth Editions, 2004, Introduction. p. xviii/xix. ↩︎