Yasumasa Morimura é um artista e fotógrafo japonês nascido na cidade de Osaka em 1951. Morimura é especialmente famoso por suas séries de autorretratos em que aparece recriando obras primas da arte ocidental. Yasumasa Morimura também se retratou encarnando grandes personalidades históricas tais como Marilyn Monroe, Audrey Hepburn, Mao Tse Tung, Che Guevara .
Com sua arte, Morimura propõe um olhar mais complexo sobre quadros célebres como Olympia de Manet, Autorretrato com Orelha Cortada de Van Gogh, As Meninas de Velázquez, Autorretrato com Colar de Espinhos de Frida Kahlo e tantos outros. Yasumasa Morimura trabalha e vive em sua cidade natal.

Formação e primeiros trabalhos de Yasumasa Morimura
Morimura frequentou a Universidade de Artes da cidade de Kyoto. Ele se graduou no ano de 1878. Ali, ele teve aulas com o fotógrafo Ernest Satow, que por sua vez frequentemente usava a obra de Henri Cartier-Bresson em aula. Já formado, Morimura passou anos como assistente de Satow. Seu primeiro trabalho foi a série fotográfica de naturezas-mortas intitulada Barco negro na mesa ( o título foi dado em português pelo artista) de 1984. Nessa época, o estilo de Morimura era marcadamente conceitual e abstrato.1

Em 1985, Morimura participou do projeto Show Smile with Radical Will junto de Tomoaki Ishihara e Hiroshi Kimura, que foi exposto na Galeria 16 de Kyoto. Nessa mesma época, ele apresentou seu primeiro autorretrato, re-interpretação do Autorretrato com a Orelha Cortada de Vincent van Gogh, que já chamou atenção do público. Em 1990, Morimura produziu Cometman, uma performance na qual ele, com o cabelo raspado em forma de estrela, andou e performou pelas ruas de Kyoto. O trabalho, registrado em vídeo, foi fortemente inspirado pelo retrato de mesmo nome de Duchamp.
Morimura ainda desenvolveu outra performance de palco chamada Nippon cha cha, na qual o artista discute história da arte, história da Guerra no Japão e sua própria vida familiar. Nippon cha cha foi encenada diversas vezes ao longo dos anos.2
Mas foi com sua série Filha da História da Arte ( também intitulada Autorretrato enquanto História da Arte), que o artista se tornou famoso. Sua participação, anos depois, em 1998, na Bienal de Veneza, tornou o artista internacionalmente conhecido.3
O Estilo de Yasumasa Morimura
Segundo o site da galeria MEM (Multiply Encoded Messages), localizada em Osaka e local que expos trabalhos de Morimura, o artista é “conhecido por seus recursos perturbam esquemas binários como Ocidental e Oriental, feminino e masculino, e contemporâneo e antigo, nas imagens originais.4
Na série Filha da História da Arte, Yasumasa Morimura encarnou vários personagens, usualmente femininos mas não unicamente, de obras primas da pintura Ocidental, reinterpretando-as. Alguns deles são: Mona Lisa em sua Origem, Um Diálogo com Frida Kahlo (colar de espinhos), os retratos re-feitos de todos os personagens de As Meninas de Velázquez, o já citado Autorretrato com a Orelha Cortada de Van Gogh e muitos outros.
Uma de suas releituras mais famosas é o chamado Futago baseado na obra Olympia de Édouard Manet. Nele, Morimura refaz o papel das duas personagens e reconfigura todo o cenário com itens da cultura japonesa. O gato do quadro de Manet, por exemplo, é um maneki neko, o famoso gatinho japonês da sorte.
A releitura de Olympia passa por todo o ambiente que o artista reformulou e também o figurino, o que fica claro pelo adereço de cabeça que a figura de Yasumasa, reclinada, porta. Por ocasião de uma exposição do trabalho do trabalho de Morimura na Galleria d’Arte Moderna (Bolonha) ocorrida em 2000, os autores Danilo Eccher e Achille Bonito Oliva destacaram essa particularidade da obra do japonês:
“A quase maníaca atenção ao detalhe [de Morimura] – uma tentativa de se identificar com o sujeito [da pintura] totalmente – continua sendo uma das características típicas de seu trabalho.”5

Sobre a obra, podemos ler no texto sobre o artista no site da galeria Ocula: “(…) ao fazer suas alterações, ele retira o mistério, desejo e atração subjacentes do original e apresenta sua própria alternativa, encorajando o observador a refletir sobre ideais de beleza e desejo dentro do cânon da arte Ocidental e sobre consciência.“6
O próprio Morimura já afirmou que sua experiência pessoal das artes Ocidentais e Orientais é ambivalente: “Eu tenho uma relação de amor e ódio com a cultura Ocidental.”7
Para além das questões entre Ocidente e Oriente, o inclui as de Colonizador e Colonizado, Morimura também, segundo o site Luhrng Augustine, “subverte o conceito de olhar masculino.”8
Sobre seu autorretrato vestido de Marilyn Monroe, os pesquisadores Jacks Selistre e Rosa María Branca, que em artigo comparam o trabalho de Yasumasa ao da fotógrafa Cindy Sherman, afirmam: ” (…) a imitação da personagem [M. Monroe] em questão coloca a masculinidade/ feminilidade canônica em jogo, mostrando-as como construção interpelada histórica e sociologicamente.”9

Morimura já afirmou que sua arte vai além de simplesmente se vestir de personalidades e personagens femininas:
“Meu propósito não é meramente performar o ato de atuar como uma mulher. Eu também não faço os autorretratos fotográficos para realizar um desejo de me tornar mulher. Por causa da minha fascinação com a borda da água que-não-é-terra-nem-mar, meu objetivo foi explorar a “margem nem-homem-nem-mulher”, percebê-la usando o crossdressing como meu método escolhido de investigação.”10
Yasumasa e o Requiem para o século XX: líderes políticos
Yasumasa Morimura também se dedicou à (re)criação de retratos de grandes líderes políticos. Nesses trabalhos, o artista não apenas se caracterizou como tais figuras, que incluem Mao Tse Tung, Hitler, Che Guevara e outros, como também produziu vídeos em que proclamava uma versão retrabalhada de discursos desses políticos. A serie tem como título Réquiem para o século XX: Crepúsculo dos Deuses Turbulentos. Entre as pessoas ilustres, Morimura encarnou o célebre escritor, dramaturgo e líder Yukio Mishima.

Mishima foi um dos maiores escritores japoneses do século XX. Desde seu grande sucesso inicial, Confissões de uma Máscara, até o livro que acredita-se ser o seu melhor, Pavilhão Dourado, o autor conquistou público e crítica, dentro e fora do Japão. Mishima foi um dos nomes cotados a ganhar o prêmio Nobel de Literatura por seu país.
O autor, no entanto, insatisfeito com a situação política do Japão após a Segunda Guerra, entre outros motivos, se tornou um líder de um grupo paramilitar chamado Sociedade do Escudo. Em novembro de 1970, após escrever o último capítulo de seu último livro, Yukio Mishima incitou os soldados a um golpe de Estado e, então, cometeu suicídio ritual.
Yasumasa afirmou em discurso que a morte de Yukio Mishima o entristeceu profundamente. Yukio Mishima foi uma das personalidades que Morimura encarnou na sua série Réquiem. Sobre isso, o artista afirmou: “(…) esse vídeo é uma homenagem a Yukio Mishima, que viveu em uma era de pós-guerra da história espiritual do Japão, na qual havia uma separação entre coisas consideradas japonesas e aquelas consideradas americanas ou ocidentais.”11
A propósito, podemos citar a breve análise de Shirley Madill sobre o trabalho de Morimura e o significado, para o artista, de se apropriar de obras primas da arte do Ocidente:
“Morimura trabalha com uma imagem de significado cultural real privada da familiaridade e reprodução. Por meio de sua própria presente ele confirma o status [dessa imagem] de um artefato tomado comentando ainda em sua diminuição…. As auto-encarnações de Morimura são críticas insolentes de e também reverências aduladoras aos mestres ocidentais.“12
Apesar de ter se consagrado com suas séries de autorretratos, Yasumasa Morimura já afirmou não ter apreço pelo destaque e atenção, se definindo como “recluso”:
“Eu nunca gostei de aparecer na frente das pessoas. […] Pelo contrário, como eu basicamente era um recluso, meus autorretratos foram um jeito de me curar e me forçar a sair para o mundo, um remédio auto prescrito, drástico.“13
Bibliografia sobre Yasumasa Morimura
GORMAN, Caitlin. “Yasumasa Morimura: Appropriator of Images, Cultures, and Identities” (MA thesis, College of Bowling Green State University, May 2013).
MAIA, Antonio Layton Souza. YASUMASA MORIMURA DIANTE DA OLYMPIA (1863) DE MANET: IMAGEM DIALÉTICA E INTER-REFERÊNCIA EM FUTAGO (1988).. In: Existências: Anais do 31º Encontro Nacional da ANPAP. Anais…Recife(PE) On-line, 2022. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/31ENANPAP2022/513550-YASUMASA-MORIMURA-DIANTE-DA-OLYMPIA-(1863)-DE-MANET–IMAGEM-DIALETICA-E-INTER-REFERENCIA-EM-FUTAGO-(1988). Acesso em: 07/01/2025
SELISTRE, Jacks Ricardo; BLANCA, Rosa María. Rupturas identitárias na produção artística de Cindy Sherman e Yasumasa Morimura. Palíndromo, Florianópolis, v. 10, n. 21, p. 116–129, 2018. DOI: 10.5965/2175234610212018116. Disponível aqui.
Referências
- MEM (multiply encoded messages) – página em inglês com uma curta biografia sobre Yasumasa Morimura. ↩︎
- Japan Society -página em inglês com um curto resumo sobre Nippon Cha Cha Cha. ↩︎
- MEM (multiply encoded messages) – página em inglês com uma curta biografia sobre Yasumasa Morimura. ↩︎
- MEM (multiply encoded messages) – página em inglês com uma curta biografia sobre Yasumasa Morimura. ↩︎
- Oliva Achille Bonito and Danilo Eccher, Appearance. Exh. Cat., (Bologna, Italy: Galleria d’Arte Moderna, 2000), p. 59. apud GORMAN, Caitlin. “Yasumasa Morimura: Appropriator of Images, Cultures, and Identities” (MA thesis, College of Bowling Green State University, May 2013). p. 13. ↩︎
- Site Ocula, que contém com retratos de Yasumasa Morimura como Kafka, Greta Garbo e outras. ↩︎
- Site ShugoArt. ↩︎
- Site da galeria Luhring Augustine sobre o artista. ↩︎
- SELISTRE, Jacks Ricardo; BLANCA, Rosa María. Rupturas identitárias na produção artística de Cindy Sherman e Yasumasa Morimura.Palíndromo, Florianópolis, v. 10, n. 21, p. 116–129, 2018. DOI: 10.5965/2175234610212018116. p. 124. ↩︎
- Kuspit, Donald. Daughter of Art History: photographs by Yasumasa Morimura. (New York: Aperture Foundation, Inc., 2003). p.73 apud GORMAN, Caitlin. “Yasumasa Morimura: Appropriator of Images, Cultures, and Identities” (MA thesis, College of Bowling Green State University, May 2013). p. 27-28. ↩︎
- Discurso de Yasumasa Morimura que pode ser acessado no site do D. Keene Center. ↩︎
- Shirley Madill. Quotation, Re-Presenting History. Exh. Cat. (Winnipeg, Canada: Winnipeg Art Gallery.1994), p. 21. apud GORMAN, Caitlin. “Yasumasa Morimura: Appropriator of Images, Cultures, and Identities” (MA thesis, College of Bowling Green State University, May 2013). p. 12. ↩︎
- Site ShugoArt. ↩︎